Uma carta depois de tanto tempo
Um rascunho de um pequeno e confuso desabafo e fixações estranhas
Oi, tudo bem com você? Infelizmente nossa correspondência se tornou muito menos frequente do que eu gostaria, mas eu quero muito mudar isso em breve. “Em breve” tem sido uma das minhas expressões favoritas para quase tudo na vida. Em breve as coisas ficarão boas, eu espero. E você, como está por aí? Dessa vez vou mudar um pouco e pedir aqui no comecinho para que você responda este e-mail. Eu vou gostar muito de saber como está aí do outro lado.
😣
Já tem umas boas semanas que penso em dar notícias, mas tenho estado triste demais para isso - mesmo com momentos de felicidade diários na vida cotidiana. Tenho percebido como o trabalho, o desempenho de funções profissionais com o objetivo de ganhar dinheiro e pagar as contas, me afeta. Tá bem, afeta todo mundo e cada vez mais, mas eu tenho me incomodado mais que o normal com minhas experiências pessoais neste momento.
Participei de uma reunião recente, com uma equipe bem legal, com pessoas cujo trabalho acompanho há um tempo. Massa, né? Até o momento da apresentação de cada um. Todo mundo ali falando o que fez e faz, anos de formação, trabalho com isso e aquilo. Normal, eu acho. A gente se apresenta com o currículo até quando não tá falando de trabalho. Mas chegou minha vez. Me apresentei como um trabalhador da internet. Isso é obviamente muito ruim. Genérico, pouco descritivo, vago, muito ruim.
Mas era assim que eu me sentia naquele momento ali. Eu trabalho com internet e com todas as possibilidades que ela oferece de contar histórias. Nos longínquos anos 2000 eu já estava futucando blogs e protocolos de transferência de arquivos antes mesmo de imaginar cursar comunicação formalmente. Eu já produzia filmes amadores horríveis com o objetivo de fazer as pessoas rirem. Aquelas que filmavam comigo e as que assistiriam isso depois. Antes de entender qualquer coisa sobre linguagem audiovisual e um futuro interesse por filmes (e séries, devo falar sobre Peaky Blinders em breve aqui nesta mesma carta).
Eu trabalhei em redações de veículos tradicionais de jornalismo, mas na parte das matérias para o site. Olha a internet aí, por mais que as pautas não fossem muito diferentes das outras mídias. Até ganhei prêmios de jornalismo contando e ajudando amigos a contarem história. Mas naquele momento, para aquelas pessoas, eu quis me descrever como um trabalhador da internet, porque no final das contas é por aqui que eu me sinto mais à vontade. Sigo tentando trabalhar assim, mesmo que seja difícil para mim explicar o que eu faço. Mesmo que eu acabe sendo genérico, pouco descritivo ou vago. Espero não ser sempre muito ruim.
Pela ordi
Para além deste estranho desabafo, e eu espero com todo coração que você tenha passado por ele sem achar muito chato, eu comecei a rever a série britânica Peaky Blinders, sucesso na Netflix e em páginas de Instagram sobre mentalidades empreendedoras e milionárias.
A minha principal desculpa para rever a série é ver acompanhado da minha esposa. Eu espero que ela goste. Também tenho essa fixação com algumas séries de rever tudo antes de assistir uma nova temporada. Nessa vez comecei a reparar algumas coisas diferentes, talvez eu use essas cartas para fazer comentários aleatórios sobre algumas coisas que eu pensei assistindo. Um exemplo: no segundo episódio da primeira temporada, o personagem frio e calculista de Cillian Murphy, o Thomas Sheldon hehehe, oferece um cigarro para uma mulher em um pub.
O cigarro sai direto de um maço - ou pacote, ou carteira, como se fala aí na sua terra? - comercial. Ao longo das temporadas esse maço vai mudando para cigarreiras chiques. E como eles fumam neste seriado, não é mesmo? Esta histórias da cigarreira me parece um pequeno easter egg sobre evolução de personagem e essas coisas, eu acho. Vamos ver se isso se confirma nesta décima sétima vez que assisto (talvez tenha exagerado um pouco no número, caso você tenha costumas literais de leitura). E vamos ver se encontro mais. Também pensei algumas coisas sobre a música que Grace (Annabelle Wallis) canta para Thommy neste mesmo episódio, mas ainda preciso confirmar minhas suspeitas. Se você estiver interessado posso confirmar essas suspeitas em uma carta futura.
(tudo isso acontece aí nesse vídeo, mas se você quiser ouvir só a música que a Grace canta - o que eu recomendo fortemente - é só pular pros 4min40)
Alguém na internet deve ter contado quantas vezes um cigarro aparece na série. Tipo aquele guia ilustrado sobre todas as mais de seis mil mortes de Game Of Thrones, produzido pela jornalista Shelly Tan e publicado no Washington Post. Se você clicar no link, vai para a visualização. A Shelly explica como fez essa coisa legal e muito doida em uma sequência no Twitter:
Eu mesmo tenho vontade de contar quantas vezes variações de palavras para SAPATO aparecem em todas as músicas do Arctic Monkeys. São muitas, pode ter certeza. E eu nem pretendo incluir nessa conta referências sobre meias e pés, mas acho que esses meninos de Sheffield tem uma fixação. Ou uma boa saída criativa, sei lá.
Uma pena que isso não me pareça muito promissor como função profissional com o objetivo de ganhar dinheiro e pagar as contas. Contudo não quero te encher mais com isso.
Espero que esteja tudo bem por aí e que essa seja a primeira de uma nova série de cartas com as mais estapafúrdias teorias audiovisuais, além de alguma visão crítica sobre algo trivial do mundo que talvez nem interesse tanto assim, mas me considero um sujeito muito bom de curiosidades.
Com o desejo de dias melhores. Um abraço forte.